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Tradução: Daniel M. Alves

Revisão e edição: Arnaldo Sisson Filho

[Embora o texto em inglês seja de domínio público, a tradução não é. Esse arquivo pode ser usado para qualquer propósito não comercial, desde que essa notificação de propriedade seja deixada intacta.]

 

 

(p. 71)

CAPÍTULO XXVIII

 

SOBRE O “SANGUE DE CRISTO” (2)

 

1. (*) ENQUANTO dormia eu me vi em uma ampla sala que parecia uma biblioteca, pois tinha uma grande quantidade de prateleiras repletas de livros; e nela havia várias pessoas para as quais eu falava sobre os Cristos, suas origens, sua missão e sua função na história da humanidade. E falei muito sobre Jesus, explicando que a doutrina de sua imaculada conceição deveria ser compreendida apenas em um sentido místico, e que toda a história [bíblica] acerca de seu nascimento se refere tão somente à sua iniciação, (3) a qual é o verdadeiro nascimento do Filho do Deus. E provei isso por meio de vários textos e passagens dos próprios evangelhos e outras escrituras. E falei também da origem de Jesus, e como ele tinha se tornado perfeito através do sofrimento. Ouvimos falar desse sofrimento, eu disse, mas pouco naquela sua vida que

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é registrada nos evangelhos. O sofrimento aqui referido é um longo percurso de provas e de progresso ascendente vivido em encarnações anteriores. Mencionei, então, algumas das mais recentes, mas não fui capaz de retê-las.

2. Chegando ao tema de sua paixão e morte, expliquei que essas não eram expiações, em seu sentido comumente entendido. Isso porque Deus não considera de modo algum o mero derramamento de sangue inocente como forma de absolvição da culpa moral de outros. Mas sim que o místico Sangue de Cristo, pelo qual somos salvos, não é outra coisa senão o segredo dos Cristos, através do qual eles transmutam a si mesmos do plano material para o plano espiritual, ou seja, o segredo da purificação interna.

Mostrei ainda que em todas as escrituras sagradas a palavra sangue é usada como um sinônimo para vida; e que vida, em seu sentido mais elevado, perfeito e intenso, não é a mera vida física tal como é entendida pelos materialistas, mas é a essência dessa vida, o Deus interno no homem.

E quando está escrito que aqueles nas mais elevadas cortes celestiais são os que “tornaram suas vestes brancas no sangue do Cordeiro” [Apocalipse, 7:14], isso significa que eles alcançaram a redenção através da perfeita realização do segredo dos Cristos.

E quando também é dito que o sangue de Cristo purifica de todos os pecados, isso significa que o pecado é impossível para aquele que é perfeitamente espiritualizado e que foi batizado com o batismo espiritual.

O sangue de Cristo, portanto, não é o sangue material de quem quer que seja. Ele é o segredo e o processo do aperfeiçoamento espiritual alcançado pelo Cristo, por meio do qual todos os que, seguindo seu método, conhecem a Deus e são iniciados, tornam-se redimidos e alcançam o dom da vida eterna.

E muitas outras coisas eu disse que foram, segundo me pareceu, ensinadas por algum espírito, sem que eu soubesse de antemão as coisas que eu ia dizer.

3. Agora percebi atrás de mim, um pouco à minha direita, uma bela imagem em mármore de Palas Atena. Ela ficava em uma pequena reentrância na parede, e desceu sobre ela uma luz dourada como o brilho do sol, a qual variava de quando em quando entre todas as sete cores, mas com maior freqüência para o violeta do que para as outras cores. E a luz incidia principalmente sobre a cabeça e o peito da imagem, que estava vestida como um guerreiro, com elmo, lança e escudo. E eu mal pude definir, enquanto olhava, se era uma forma viva ou de mármore, tal era a sua verossimilhança.

4. Um pouco depois, todas as pessoas para quem eu estava falando se foram, e eu estava sozinha na sala com a minha mãe. Ela estava muito aflita e agitada, me vendo como uma perdida e

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como uma apóstata, como alguém que abandonou o Cristianismo, e ela não queria ouvir qualquer explicação que eu pudesse dar sobre o assunto. Ela chorou amargamente, declarando que, com minha apostasia, eu tinha partido seu coração, e tornado a sua velhice um pesar e um fardo para ela. E disse também que eu deveria ser totalmente abandonada, a menos que eu me arrependesse e voltasse à crença ortodoxa, e me implorou de joelhos que eu me retratasse de tudo o que tinha dito.

            Não há palavras para descrever a intensidade de minha dor, e a perturbação de espírito que sua conduta me causou.

            Minha mãe parecia que iria desmaiar a meus pés com o excesso de emoção; e eu estava para me render às suas súplicas quando eu vi a porta da sala se abrir e um Espírito entrar. Ele veio e ficou do meu lado e disse estas palavras: “Quem põe a mão no arado (*) e olha para trás, não está apto para o reino de Deus. E aquele que ama pai e mãe mais do que a Mim, não é digno de Mim.” [Respectivamente: Lucas 9:62 e Mateus 10:37]

5. Então o sonho terminou e não tenho mais lembranças, mas um profundo sentimento se manteve impresso em minha mente: de que a cena era apenas um ensaio e um prenúncio de algo que realmente aconteceria no futuro de minha vida.

 

            [Nota de Edward Maitland: É uma satisfação – da qual o leitor simpatizante irá compartilhar – poder dizer que, ao tomar este sonho mais como um aviso do que como uma verdadeira predição, e ao observar a devida cautela, a oposição do tipo descrita foi reduzida a um mínimo, nenhum rompimento afetivo ou grave infortúnio aconteceu.

A imagem de Palas iluminada pelos sete raios denota a Divina Sabedoria em sua plenitude, e manifestando todos os – “Sete Espíritos de Deus” [p. ex., Apocalipse 4:5]. Como se pôde ver na ocasião, isso foi uma enfática declaração de que a doutrina enunciada foi proferida sob a inspiração de todos eles, e especialmente daqueles representados pelos dois raios dominantes: o Amor e a Reverência.]

 

NOTAS

 

(71:2) Paris, 17 de outubro 1879. Mencionado em Life of Anna Kingsford, Vol. I, pp. 315-317.

(71:3) Iniciação não envolve necessariamente a atuação de qualquer instituição humana. O verdadeiro iniciador é, em todos os casos, o Espírito Divino no próprio aspirante. E.M.

(73:*) N.Ed.: O arado aqui é claramente um símbolo. A palavra também significa plantio, ou agricultura em sentido amplo. Assim, o símbolo parece se referir à obra do amor divino, seja internamente, seja de edificação ou auxílio à humanidade. 


 

 

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