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[Tradução: Arnaldo Sisson Filho. Embora o texto em inglês seja de domínio público, a tradução não é. Esse arquivo pode ser usado para qualquer propósito não comercial, desde que essa notificação de propriedade seja deixada intacta.]

 

 

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Capítulo XVIII

 

Sobre os Mistérios Gregos (1)

 

            Na celebração dos mistérios de Phoibos Apollo era proibido comer qualquer coisa sobre a qual o fogo terrestre houvesse passado. Portanto, toda a comida de seus devotos era preparada ao sol, e seu sacrifício principal consistia em frutas das altas árvores, amadurecidas pelos raios do sol.

            Estavam associados com esses mistérios de Apollo aqueles de Zeus e Hera, o Rei e a Rainha, pois tanto o homem como a mulher são admitidos ao mais elevado; e também porque Eva e Adão, sendo desse modo iniciados, se alimentavam somente de frutos não cozidos;  e, em um dos sentidos históricos da alegoria, Eva e Adão foram os primeiros Mensageiros. Era, portanto, uma ofensa a Phoibos e Zeus, que seus devotos comessem qualquer coisa pela qual tivesse passado o fogo, ou qualquer vinho fermentado. Seu vinho era o puro suco da uva bebido fresco, e seu pão era ázimo (sem fermento ou levedura) e preparado ao sol.

            Os últimos Mensageiros precisam ser iniciados, como foram Eva e Adão, nesses mais internos e mais elevados mistérios da perfeita humanidade, o qual se constitui na mais elevada de todas as castas, e intitulam àqueles que os atingiram a sentarem-se nos assentos dourados. (2)

            Esses mistérios tem também um significado interno, que não é difícil de descobrir.

            Nos mistérios de Phoibos e Zeus, o iniciado atingiu à condição de um grande Hierofante. (“Veja! Eu te conto todas as coisas.”) Ele era iluminado pelo “sol”, e estava no quarto circulo interior de espíritos, o qual é aquele dos Cristos de Deus. (3) Para esse círculo interior Jesus de Nazaré visou passar após seu ressuscitar, como estava implícito quando ele disse: “Não mais beberei da uva até que eu beba seu novo sangue no reino de Deus.”

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            Nos mistérios de Hermes, o segundo círculo – O Deus que guarda a Alma – era proibido comer qualquer criatura que tivesse vida, ou, melhor, que tivesse olhos que vissem. (4) Pois Hermes é o Vidente. Seus devotos partilhavam somente alimentos vegetais, que podiam ser cozidos com fogo terrestre, e de vinho, que podia ser fermentado.

A seguir, na ordem, havia as orgias de Her, que surgiu do mar; e nessas os iniciados podiam comer peixe que fosse realmente peixe, com barbatanas e escamas, mas assado no fogo, não cru. Por essa razão, como aquela Deusa é o Anjo da Harmonia, ou da Doce Canção, comer peixe tornou-se um símbolo de amor e união fraternais; e dois pequenos peixes juntos eram o modelo místico de crianças pequenas vivendo juntas em unidade ou caridade. (5) Pois os peixes nadam em pares; e Ele que pescava homens, os atraiu para si por meio do amor. E todos os pescadores estavam sob a proteção da Rainha do Mar. Há duas verdades místicas que pertencem aos mistérios de Maria, a Estrela do Mar; e elas são, em seu sentido interior, os dois peixes que Jesus deu à multidão. Sobre isso depois eu falarei mais, quando lhe falar sobre as doze cestas de pão. Pois essas são as cestas que as doze virgens carregavam nas orgias divinas.

            Nos mistérios de Baco era permitido ao círculo externo que comesse, se de fato desejassem, toda a carne salva dos impuros. Isto é, poderiam comer de todos os animais limpos dos campos e os pássaros do ar. Essa era a quarta e a mais inferior das castas. Porém, os devotos de Iaco (o Baco místico), tendo conhecimento sobre todos os ritos mais elevados, abstiveram-se destas coisas, embora as permitissem para a multidão, que apenas participavam corporalmente dos ritos. Porque nenhum daqueles que eram devotos de Dionísio (ou Iaco) não eram iniciados nos ritos de Demeter e Afrodite. E por essa razão havia como substitutos aos mistérios de Dionísio aqueles de Ceres, a Mãe Terra, nos quais o uso de carne era totalmente proibido. Por esse motivo também não se ouve falar sobre os mistérios de Baco, a não ser com relação ao vinho, seja fermentado ou não; pois o significado interior de seus ritos tinha relação com a verdade e com o significado das coisas. As orgias de Ceres e Baco eram, assim, unidas, a Deusa sendo honrada em seu pão, e o Deus em seu cálice da verdade. Pois, nessas orgias, esses são corpo e espírito, sólido e fluido, externo e interno, eles abrangem todas as coisas na terra e no céu.

            E além do círculo de Dionísio, havia ainda outro – aquele de

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um Deus que também de fato tinha as suas orgias, mas essas eram proibidas, salvo em certas nações violentas e em tempos bárbaros. Pois, nos mistérios de Ares, o Homem da Guerra, eles ofereciam sacrifício e comiam carne humana e carne de cavalo, o qual também guerreava junto com o homem. Isso porque esse círculo está fora do reino dos círculos quádruplos, e pertencia aos animais de rapina. E sua estrela é vermelha, assim como o sangue dos que foram mortos. Mas as orgias de Ares, aquele de cabeça de Carneiro, por nenhum homem eram celebradas, salvo na guerra; e aquele que conhecia o Deus não poupava sua vida, mas livremente sacrificava a si mesmo (na guerra). Porque era uma abominação comer no altar de Ares em tempo de paz.

            Contudo, Ares tinha também seu significado interior – Ó Conhecimento, vós sois difícil de acessar! O Cavalo (que é o símbolo do intelecto) morreu por vós, e o Guerreiro está trespassado. Vós sois o Homem da Guerra, e de ferro são as rodas de vossa biga!

            As Escrituras Hebraicas descrevem o Senhor Jeová, ou Logos, como operando como Espírito do quinto círculo, quando elas falam de Deus como um Homem de Guerra. E o Livro da Sabedoria (xviii, 15) assim O representa. Pois a Palavra Divina assume muitas formas, aparecendo algumas vezes como um, algumas vezes como outro, de Seus Sete Anjos, ou Elohim. Esses são apenas Sete; porque esse número compreende todos os Espíritos de Deus. De modo que quando o sétimo é ultrapassado, a oitava inicia novamente, e a mesma série de processos é repetida fora, como reflexos das mesmas Sete Luzes – tornando-se, pela distância, cada vez mais fracas.

            Veja que acima de todas as coisas tu ensines a doutrina das Castas. Os Cristãos cometeram um sério erro ao exigir a mesma regra para todas as pessoas. As castas são como escadas pelas quais se pode ascender do mais baixo para o mais elevado. Elas são, apropriadamente, graus espirituais, e não tem nenhuma relação com a condição externa da vida. Como todas as outras doutrinas, aquela das castas tem sido materializada. As castas são em número de quatro, e correspondem à natureza quádrupla do homem.

Os Daimons, Anjos da Guarda, ou Gênios pertencem à ordem dos Serafins, ou Serpentes da Luz, os quais circundam e surgem da esfera suprema. Daí a ideia da serpente como um anjo caído, os astrais sendo serpentes de fogo, surgindo do Hades, ou – o material e astral – mundo inferior, o qual é o anverso (ou reverso) do superior.

            Vênus, ou Afrodite, é a Harmonia celestial – aquele unificador poder de simpatia que purifica, ilumina e embeleza. A Maçã em sua mão é o Cosmos (significando o mundo sustentado e redimido pelo Amor).

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            A Coruja, sagrada para Palas, e o Gato, sagrado para Hermes, são modelos do Vidente. Pois Sabedoria e Compreensão podem ver coisas nos lugares escuros.

            A Pilhagem (ou Roubo) dos Egípcios tem uma referência secundária quanto à apropriação de seus mistérios sagrados pelos hebreus. A principal referência é sobre o enriquecimento e edificação da alma por meio de lições obtidas pelas experiências do corpo, simbolizado como Egito.

            O Ar, Palas é a descendência de Éter (Ether), Júpiter, ou Substância original, em seu aspecto masculino. O Éter é universalmente difundido, penetrando todos os lugares, ou, melhor dizendo, impossível de ser excluído de qualquer lugar. Os átomos giratórios dos mais densos sólidos se movimentam (giram, revolvem) no éter, assim como fazem os planetas no espaço. Em certo sentido, Éter é o espaço.

 

A Alma, Perséfone, é a filha da Terra, Demeter ou Movimento e de Éter, Zeus ou Repouso, respectivamente o visível e o invisível. Para aquele que conhece os mistérios de Demeter ou Ceres, o alimentar-se de carne é uma abominação.

            Esses mistérios continham, entre outras coisas, a relação da alma com os elementos pelos quais está envolvida por dentro e por fora – a saber, pelo movimento e matéria pelo lado de fora, e pelo repouso e espírito pelo lado de dentro. Portanto, Demeter e seus mistérios são de profunda importância, e estão relacionados aos segredos mais internos. Como a força que faz com que o espírito se torne manifestado como matéria ou terra, ela é a Mãe-Terra e o poder pelo qual ocorre a germinação. Constituindo tudo o que é fixo e sólido, ela é criação, ou manifestação através da ação ou movimento, o invisível tornado visível. E a ela é devido o fenomênico ou ilusório, pelo qual sua filha Perséfone – ou a alma – é atraída para fora e para baixo. Ilusão, o corpo “ígneo” ou elétrico gerado pelo movimento, e operando como um véu para ocultar a realidade interna, é Maya e Glamour (Fascínio, Atração); e a alma, ao seguir esse, é arrastada a Hades por seu regente Plutão (o Deus especialmente dos ricos, eles próprios ilusórios como produtos da terra). Comendo a Maçã Mística (a “Maçã” de Eva), o volátil torna-se alquimicamente fixo, a alma é incorporada ao corpo e, pelo menos em parte, materializada, e não é mais “virgem” ou pura, porque está casada à carne e aos sentidos. Devido à súplica de sua mãe, que temia sua total imersão na matéria, e consequente perdição final, Zeus concede que ela possa dividir sua existência entre os dois mundos ou condições, a terrena e a celestial, sendo – enquanto no inferior – Rainha das Sombras ou daqueles que dormem, estando inconscientes das coisas espirituais.

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            Assim, o corpo volátil ou astral, o qual é a imediata manifestação da alma, é o filho – ou produto – do Movimento; e o Movimento é o filho do Tempo (Cronos ou Saturno) e da Substância, a qual é Rea, ou o Espírito Santo em seu aspecto feminino. Esta última é a Grande Mãe, a original Panteia. A produção do corpo material pela fixação das partículas do corpo volátil vem da reversão (ou inversão) dos polos daquelas partículas, por meio da tendência para o externo da vontade do indivíduo, e sua separação, ou divergência, da vontade Divina ou central.

            A força pela qual Zeus, o espírito central, produz a alma ou corpo etéreo, e o qual também a alma usa para projetar-se ainda mais longe, é a mesma força pela qual o sistema é transmutado e aspirado outra vez para seu centro Divino e tornado volátil. A força é uma só, é a vontade e a direção que são várias.

            Em um sentido, Perséfone é o grão de trigo; Ceres, o solo; e Hades, a escuridão que esconde o grão, até que, sob a influência solar, ele emerge e retorna à luz. Foi devido a um mal entendido dos mistérios de Ceres, e do significado verdadeiro da ressurreição do corpo, que o costume de queimar os mortos foi abandonado e trocado pelo de enterrá-los.

            Os Deuses dos elementos, Atenas (ar), Posseidon (água), Hefaistos (fogo), e Demeter (terra), estão entre os maiores, e estão perto do trono, tendo poder (alcance) universal, na medida em que seu império é universal. (6)

 

Notas

 

(1)   – Londres 27 de março de 1881. Recebido em sonho.

(2)   – Ver n°. 22 e também a obra Sonhos e Histórias de Sonhos, nº. 9.

(3)   – Compare, Hino a Phoibos, Parte 2, nº. 11.

(4)   – Compare, Exortação de Hermes a seus Neófitos, Parte 2, nº 12, (2).

(5)   – Compare, Hino de Afrodite, Parte 2, nº. 14, (2).

(6)   – Ver Parte 2, nº. 13, parte 2, e Apêndice, nota R.

 

 

 

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