XIII.
Cristo, a Realização no Homem de
Suas Próprias Potencialidades Divinas
1. (*)
Desse modo, o Cristo da Bíblia, o Cristo de Deus, o Cristo da Natureza e o da
Gnose não é nenhum personagem único, anormal, inconcebível, de constituição
híbrida e desordenada, tal como é aquele Cristo apresentado pelo Sacerdotalismo.
Sendo o equivalente, no homem, do Logos na Deidade, Ele é a Perfeita Razão de
Deus na manifestação. Ele é o cumprimento, e não a subversão, da ordem
natural-divina, a realização, tanto para o indivíduo quanto para o universal,
das divinas potencialidades próprias e comuns a todos, em virtude de sua origem
e constituição, pela lei imutável da Hereditariedade; o fruto maduro da semente
implantada em todo homem, a semente de sua própria regeneração; a demonstração
da “jóia preciosa” da divindade “nascida na fronte do sapo”, símbolo alquímico
da matéria. E Nele, definido dessa forma, é devolvido ao homem o Salvador, o
qual lhe foi privado pelos seus sacerdotes.
2.
Geração, degeneração, regeneração – esses são os três termos da história
espiritual do homem. O primeiro
(p. 50)
e o último são obras de Deus; o segundo é obra
do próprio homem. Pois todas as coisas se dão pela geração, a qual é o produto
da interação entre a Força e a Substância, Pai e Mãe, respectivamente, o
resultado dependendo da vontade do gerador.
Uma vez gerado, o homem é livre para se degenerar, até que chegue seu tempo de
ser regenerado. Suas
possibilidades de regeneração dependem do uso que fez de seu período de
liberdade. A evolução se dá por meio da geração; mas a escada da mesma pode ser
descida até que se alcance uma condição na qual a regeneração é impossível, e a
extinção, inevitável. O período da Graça subentendido na expressão “setenta
vezes sete” expirou para ele.
3. As assim chamadas
expressões “denunciatórias” da Bíblia e do Credo, são
simplesmente afirmações da necessidade da observância das leis do ser
para a salvação. Isso tanto para a vida espiritual como para a vida física. As
condições essenciais à vida devem, em ambos os casos, ser respeitadas. E do mesmo modo
que o fisiologista, se expressando na linguagem técnica de sua ciência, fala de
forma afirmativa quando declara que se não for pelo cumprimento de certas
funções pelo sistema físico do homem, ele sem dúvida perecerá; assim também
falam de forma afirmativa aqueles que dizem o mesmo a respeito do sistema
espiritual do homem. As condições da vida eterna, assim como as da vida
passageira, estão fundamentadas na natureza das coisas; e não há nada de
arbitrário na afirmação dessas condições por aqueles que as conhecem, mesmo que
a linguagem usada seja técnica e não compreendida pelos ignorantes. O dogmatismo
consiste tão somente na afirmação positiva daquilo que a própria pessoa que
afirma não conhece positivamente.
4. A Bíblia
especifica dois pecados como tendo um caráter especialmente hediondo e fatal,
cuja natureza seus expositores oficiais falharam em compreender, ou pelo menos
em tornar conhecido. Eles são chamados de “Anti-Cristo” e de “Blasfêmia contra o Espírito Santo.” Eles
são essencialmente de uma mesma espécie, ainda que suas manifestações sejam
diversas.
(p. 51)
A chave agora restaurada acusa o Sacerdotalismo, desde seu começo, de
representar o cometimento sistemático desses pecados em todas as suas
manifestações.
5. “É Anti-Cristo
aquele que nega o Pai e o Filho.” [1 João
2:22] O Pai e o Filho são negados quando se nega a Mãe. Pois excluir, da
forma que o Sacerdotalismo excluiu, o princípio feminino da divindade – a
Substância – é tornar impossível a
relação simbolizada pelos termos Pai e Filho, tendo em vista que eles implicam e
envolvem Esposa e Mãe.
6. Algo semelhante ocorre em relação ao pecado contra
o Espírito Santo. Tanto em repouso como em atividade, na Divindade e na
manifestação, a unidade divina deve compreender a dualidade, Força e Substância,
Pai e Mãe, para tornar possível aquela eterna geração
por meio da qual se dão a criação e a redenção, e nisso a manifestação de Deus
em Cristo.
Que o pecado dessa negação com respeito ao Espírito Santo “jamais será perdoado,
nem no mundo de hoje, quer naquele que está por vir” [Marcos 3:29], é porque, sendo um pecado contra o princípio
essencial, tanto da Existência Atual como Daquilo que Será, ele carrega sua
própria punição consigo. Ao negar que o Universo é gerado por Deus, e
constituído pela própria força e substância de Deus, nega-se que o Universo seja
uma manifestação de Deus; nega-se, portanto, aquela correspondência entre Deus e
a criação em virtude da qual “coisas invisíveis de Deus são claramente vistas, sendo
compreendidas pelas coisas de que são feitas” [Romanos
1:20].
7. E isso nega a regeneração como o processo da
manifestação de Deus através da individuação do homem, e negar isso é negar
Cristo como a coroamento da evolução e, portanto, da criação.
8. Postulando como o material da existência algo que –
não sendo essencialmente Deus – é irreal e não relacionado a Deus, tal negação
constitui a negação de qualquer relação vital entre Deus e o Universo, tal como
a de paternidade e filiação, ao ponto da exclusão da idéia do dever de um para
com o outro, em ambas as direções. E considerar Deus
(p. 52)
apenas como
Força, e não Substância; Vontade apenas, e não Amor; coloca no lugar de um Deus
vivo e de um Universo vivo tão somente causa e efeito mecânicos e inconscientes.
9. A frase de Jesus: “meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus” [João 20:17], é uma afirmação da divindade da substância e, consequentemente, da consubstancialidade de Deus e do homem. Foi tão somente o Sacerdotalismo que transformou o homem em um “filho do diabo”. Ao fazer isso o Sacerdotalismo atribuiu ao homem precisamente a paternidade que Jesus atribui ao próprio Sacerdotalismo, como quando dirigindo-se aos seus perseguidores e assassinos sacerdotais, ele diz: “Vós sois do vosso pai, o diabo” [João 8:44].
NOTA
(*) Esse numeração representa os parágrafos no original em inglês.
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