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(p. lxxxi)
PREFÁCIO PARA A PRIMEIRA EDIÇÃO
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SEGUNDO a lenda clássica, a 
Deusa Atenas teve certa vez como servidora consagrada a seu serviço uma linda 
virgem chamada Medusa, a qual, tornando-se vaidosa por causa de sua beleza e 
descontente com o serviço puro prestado à jovem Deusa, introduziu a insensatez e 
a depravação no próprio santuário do Templo no qual ela costumava prestar 
serviço religioso. Em conseqüência disso, um terrível destino se abateu sobre 
ela. O lindo rosto, que foi a causa de sua queda, assumiu um aspecto tão 
horrível que destruía e petrificava todos os que olhassem para ele; os cachos de 
seu cabelo, que eram o principal motivo de seu orgulho, foram transformados em 
víboras, e suas mãos que haviam prestado o serviço sagrado tornaram-se como as 
garras de uma ave de rapina. Transformada, assim, 
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lxxxii)
havia sido acorrentada a uma pedra na beira do mar e 
estava prestes a ser devorada, quando Perseu – guiado pelos seres divinos para a 
cena do pretendido sacrifício – derrotou o Dragão e libertou a princesa. E, 
tendo conquistado seu amor e a esposado, o filho de Zeus tirou-a do reino de seu 
pai e a levou para os céus, para brilhar para sempre ao seu lado, redimida, 
imortal e gloriosa.
        Ora, 
os nomes Medusa e Andrômeda possuem uma raiz comum, e significam respectivamente 
“guardiã” ou “casa” da Sabedoria, e “regente” ou “companheira” do Homem. São, 
portanto, nomes representativos, o primeiro da Igreja, e o segundo da Alma. E os 
dois mitos nos quais aquelas que têm esses nomes são as heroínas, juntos 
constituem uma profecia – ou verdade perene – que tem especial aplicação para a 
época presente. Medusa é aquele sistema que, sendo originalmente puro e belo – a 
Igreja de Deus e a guardiã dos Mistérios – tornou-se, devido à corrupção e à 
idolatria, “sustentáculo de tudo o que é impuro”, e a mãe de filhos monstruosos. 
E, além disso, da mesma forma que a anteriormente encantadora face de Medusa, a 
Doutrina que originalmente possuía o selo divino e refletia a Própria Sabedoria 
Celestial, transformou-se, por meio da degradação da Igreja, em Dogma tão 
pernicioso e mortal a ponto de arruinar e destruir a razão de todos aqueles que 
caem sob seu controle. E o Perseu do mito é a verdadeira Humanidade 
[N.T.: Natureza do Ser Humano.] de fato nascida na terra, 
mas filha dos céus – que dotada pela Sabedoria e pelo Entendimento, com as asas 
da Coragem, com o escudo da Intuição, e com a espada da Ciência, partiu para 
derrotar e destruir a corrupta Igreja e
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lxxxiii)
libertar o mundo de sua influência ruinosa. Mas não basta 
que a Górgone seja morta. Uma tarefa ainda maior e 
mais gloriosa espera para ser realizada. Andrômeda, a Alma, a melhor parte do 
Homem, está a ponto de ser inteiramente devorada pelo dragão maligno da Negação, 
que é o agente da natureza inferior, e o destruidor de todas as esperanças da 
humanidade. Seu nome – idêntico aos termos com os quais é descrita a primeira 
Mulher da história dos hebreus – a aponta como a companheira e regente do homem; 
sua paternidade indica a origem da Alma, que nasce do Fogo astral ou Éter, 
simbolizado pela terra da Etiópia; os grilhões de bronze com que ela é presa à 
rocha são o símbolo da atual escravidão do Divino no homem a sua parte material; 
e a sua redenção, casamento, e exaltação pelo herói Perseu, prenunciam o 
coroamento e a realização final do Filho de Deus, o qual não é outra coisa senão 
o Ser Humano Espiritual fortalecido e sustentado pela Sabedoria e pelo 
Pensamento. De nada servem, contra o monstro que ameaça aniquilar a Alma, os 
velhos recursos de terrorismo, perseguição e servidão por meio dos 
quais a Igreja corrupta busca subjugar a humanidade a seu credo. O 
Libertador da Alma deve ser livre como o ar, nascido nas asas de um Pensamento 
que não conhece qualquer medo e repressão, e armado com a 
espada – de dois gumes e voltada para todas as direções – de um 
conhecimento igualmente potente tanto para atacar como para defender. E ele deve ser sábio e livre em todos os sentidos, não inclinado 
apenas para a destruição, mas igualmente para a salvação, e sua espada deve ser 
tão apta para golpear os grilhões dos membros de Andrômeda, quanto para desferir 
o golpe mortal à Górgone. Não basta
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lxxxiv)
que ele leve ao Olimpo a 
cabeça morta de Medusa; ele precisa levar para lá também uma Noiva viva. Sua 
missão não é apenas satisfazer a Mente, mas também contentar o Coração. O 
Intelecto – o “Homem” – é aquele que empunha a espada do libertador; e a 
Intuição – a “Mulher” – é aquela que cria e constrói. Não fosse pelo trabalho 
dela a bravura (e destreza) de Perseu seria vã, e seus feitos sem objetivo ou 
recompensa. O herói traz consigo as conquistas (da luta) e os leva para sua 
tenda, e pendura seu escudo e sua lança ao lado do fogo da lareira. Todas as 
honras são dadas ao guerreiro, quer como iconoclasta, quer como cientista, e 
como purificador da terra. Seu trabalho, contudo, é apenas no sentido de 
iniciar, de preparar a senda, abrindo o caminho para Ela que não carrega nem 
tocha e nem arma de guerra. Por ela é o intelecto coroado; por ela é a 
humanidade completada; nela o Filho de Zeus encontra sua eterna e suprema 
recompensa; pois ela é o santuário, ao mesmo tempo da mais divina Sabedoria e do 
perfeito Amor.
        É 
evidente, assim, que a estória (lenda) clássica – de forma idêntica em 
substância às profecias alegóricas das escrituras hebraicas e cristãs – exibe a 
obra do Salvador ou Libertador, como tendo um duplo caráter. Como Zeus, o Pai 
dos Espíritos, de quem ele é filho, o Intelecto (Razão) é ao mesmo tempo 
Purificador e Redentor. Uma vez realizada a tarefa de Destruição, aquela de 
Reconstrução deve iniciar. A primeira já está quase completa, mas até agora 
ninguém parece ter sonhado que a última seja possível. A época atual testemunhou 
o declínio e a queda de um sistema que, depois de ter-se mantido com sucesso por 
cerca de dezoito séculos contra inúmeros perigos de ataques externos,
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e de facções internas, finalmente sucumbiu diante 
da união das armas da crítica científica e moral. Mas essa própria derrubada, 
essa própria demolição, cria um novo vazio. E da existência desse vazio dão 
amplo testemunho as atuais condições do mundo e as apreensões e ânsias que se 
expressam por todos os lugares. Em todas as partes os homens se perguntam: “Quem 
nos mostrará algum bem?” A quem ou ao que recorreremos em busca de conselho e de 
salvação da Perdição, se o antigo sistema sucumbir? Debaixo de que 
teto nos abrigaremos se todo o Templo for demolido e “não restar pedra 
sobre pedra que não seja derribada?” [N.T.: 
Mateus
24:2] Que caminho poderá nos levar a Sião se a velha estrada for soterrada pela avalanche? O 
Agnosticismo e o Pessimismo tomaram conta dos melhores intelectos da presente 
época. A consciência foi eclipsada pelo auto-interesse, a mente obscurecida pela 
matéria, e a percepção do homem de sua natureza superior, e das necessidades 
dessa última, foi suprimida em favor da inferior. A regra de conduta entre os 
homens rapidamente está se tornando aquela da fera predadora: – a regra do eu 
antes de tudo; e a do eu mundano, bruto e ignóbil. Por toda parte o significado 
e a utilização da própria vida estão sendo seriamente questionados; por toda 
parte busca-se sustentar a humanidade por meios que são em si 
mesmos
corruptores da humanidade; por toda parte as fontes que alimentam o grande 
oceano da sociedade humana estão jorrando e um dilúvio é iminente, cuja altura, 
extensão e duração ninguém pode prever. E ainda em nenhum lugar se pode perceber 
a Arca, refugiando-se na qual a humanidade possa superar e sobreviver à 
inundação.
        Não 
obstante, essa Arca tão ansiosamente buscada, essa Senda
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lxxxvi)
tão dolorosamente procurada, 
esse trabalho de Reconstrução tão urgentemente necessário, todos podem ser 
alcançados pelo homem. A certeza de sua conquista está imbricada na própria 
natureza da existência, e está ratificada em todas as expressões dadas aos 
mistérios dessa natureza, desde os primórdios do mundo.
        O 
principal objetivo da presente obra é, portanto, não de demolir, mas de 
reconstruir. O necessário trabalho de destruição já foi amplamente realizado. O 
antigo Templo foi posto ao chão e saqueado, e os “filhos de Israel” foram 
levados cativos para a “Babilônia” – o nome místico da fortaleza do 
Materialismo. Como está escrito: “E todos os objetos da casa de Deus” – isto é, 
as doutrinas da Igreja – “grandes e pequenos, e os tesouros da casa do Senhor, e 
os tesouros do rei e de seus príncipes, tudo isso ele levou para Babilônia. E 
queimaram a casa de Deus, e demoliram os muros de Jerusalém” – isto é, da Alma – 
“e incendiaram todos os seus palácios, e destruíram todos os seus vasos 
preciosos”. 
[N.T.:
2 Crônicas 36:18-19]
        É 
tempo agora de encenar o segundo e último ato do drama profético; – “Assim falou 
Ciro,” – isto é, KurioV, o Senhor, o Cristo – “o Deus do céu entregou-me todos os reinos da 
terra; e encarregou-me de Lhe edificar novamente um Templo em Jerusalém”. “Quem 
dentre vós irá para lá e construirá de novo o Templo do Senhor Deus de Israel?”
[N.T.: 2 Crônicas 36:23]
        Nessas 
palavras está expressa a intenção dos escritores deste livro. E se preferiram 
não revelar seus
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lxxxvii)
nomes não é porque não confiam na genuinidade de sua 
tarefa ou na integridade de seu trabalho, nem porque se encolhem diante da 
responsabilidade assumida; mas para que seu trabalho possa repousar sobre seus 
próprios méritos e não sobre os deles – reais ou supostos – ou seja, a fim de 
que possa ser julgado e não pré-julgado de uma maneira ou outra. Essa discrição 
está de acordo com todo o seu conteúdo. Pois o único critério para o qual faz 
apelo em seu favor é o Entendimento, e isso com o fundamento de que é algo 
contrário à natureza da Verdade prevalecer por força de autoridade, ou qualquer 
outra coisa que não seja o entendimento; uma vez que a Verdade – por mais 
transcendente que possa ser – tem sua verificação na Mente, e nenhuma outra 
testificação
(comprovação) pode lhe servir. Se a verdade não for demonstrável para a mente, é 
evidente que o homem, que é essencialmente mente, e produto da mente, não a pode 
reconhecer e apropriar-se dela. O que é indispensável é que se apele para toda a 
mente, e não apenas para um de seus departamentos.
        Neste 
livro nada de novo é dito; mas aquilo que é antigo – tão antigo que a coisa em 
si ou o seu significado foram perdidos – é restaurado e explicado. Contudo, 
muito embora não aceitem nem as exposições de uma ortodoxia conservadora, nem as 
conclusões de uma crítica destrutiva, seus escritores reconhecem os serviços 
prestados por ambos para a causa da Verdade. Pois – como os puritanos que 
cobriram e esconderam, com reboco e de outros modos, imagens e decorações 
sagradas que para eles eram ofensivas – a ortodoxia pelo menos conservou através 
das idades os símbolos que contêm a Verdade, debaixo dos erros com os quais
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lxxxviii)
os cobriram. E a crítica destrutiva, por mais que 
seja brutalmente descrente, pelo próprio ato de destruição, limpou o caminho 
para a reconstrução. Ela cumpriu a função do homem – aquela de análise – e 
tornou possível a função da mulher – aquela de síntese. E isso está de acordo 
com a ordem Divina.
        Tanto 
em natureza quanto em método, portanto, este livro é principalmente
interpretativo, e, conseqüentemente, 
reconciliatório. E é assim não apenas especificamente em relação aos 
sistemas hebraico, cristão, oriental e clássico, mas também com relação ao 
pensamento moderno e à experiência humana 
        ADVENTO 1881.
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