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III.

 

A Bíblia Insiste no Sentido Esotérico

 

 

            Vamos, inicialmente, defender – a partir da própria Escritura – a afirmação da existência de um sentido esotérico, o qual a Escritura insiste como sendo seu sentido verdadeiro e divinamente designado.

 

            A própria necessidade de tal defesa é por si só uma prova concreta, não apenas da maneira inadequada, mas também injusta com que a Escritura tem sido tratada por seus expositores oficiais.

 

            Que essa defesa seja algo necessário fica demonstrado, indiscutivelmente, pela acusação de blasfêmia que os expositores oficiais costumam levantar contra os que advogam um sentido esotérico. Essa acusação é feita com o argumento de que tal sentido visa “desviar a Escritura de seu sentido óbvio”. Ou seja, defendem o sentido “óbvio”, a visão superficial, e não o sentido espiritual, até rotulando seus escritores de insanos por atribuírem um sentido diferente do óbvio! Como se as coisas espirituais pudessem ser “óbvias” para a visão superficial!

 

            Nesse ponto os literalistas demonstram que são incapazes de compreender que tentar transformar o sentido “óbvio” da Bíblia em seu sentido real significa destruí-la enquanto uma Bíblia, ou um livro da alma; uma vez que como livro da alma ela deve apelar à alma e não aos sentidos; e deve se referir não a pessoas, coisas e eventos pertencentes ao plano físico, mas a princípios, processos e estados puramente espirituais – ainda que expressos em termos derivados do plano físico – usando pessoas, coisas e eventos tão somente como forma de ilustração.

 

            Os literalistas falham, além disso, em ver que – diante do fato de que todas as Escrituras antigas foram escritas de forma similar, ou seja, por meio de símbolos, parábolas e alegorias – insistir que a Bíblia tenha sido concebida literalmente é torná-la absolutamente diferente de todos os outros livros de sua ordem. As seguintes são algumas das passagens em que nos baseamos: –

 

            1. “Tu verás o meu dorso” (os revestimentos usados como coberturas externas do santuário, e o material dos livros), “mas Minha face tu não verás” [Êxodo 33:23]. (Nessa passagem Moisés é informado que apenas o sentido externo, e não o verdadeiro sentido da Palavra Divina, seria reconhecido em sua época, pela razão dada a seguir: “a dureza do coração dos homens”.)

 

            2. “Moisés não lhes deu o pão do céu,” – (o alimento da compreensão). [João 6:32].

 

            3. “Mesmo até nossos dias, quando Moisés é lido, o véu está sobre seus corações. No entanto (...) ele será removido” [2 Coríntios 3:15-16].

 

            4. “Ele tira o primeiro, para que ele possa estabelecer o segundo” [Hebreus 10:9].

 

            5. “E eles (os Levitas e Anciões) leram no livro, na lei de Deus, com uma interpretação, e fizeram com que eles (o povo) compreendessem a leitura” [Neemias 8:8].

 

            6. “E o coração bom, ou compreensivo (Caleb) disse, aquele que derrotar a cidade (ou sistema) da letra (Quiriate-Sefer) e a conquistar, a ele concederei o Rasgar do Véu (Acsa), minha filha, por esposa.”

            “E o homem forte de Deus (Otniel) tomou-a, e ele concedeu-lhe o Rasgar do Véu, sua filha, por esposa. (E ela lhe trouxe como dote “as fontes superiores e inferiores”, uma expressão de uso freqüente nas Escrituras para significar a satisfação de necessidades espirituais.)

 

            7. “E aquilo que antes era chamado de a cidade, ou o sistema da letra, foi depois disso chamado de a Palavra (Debir)” [Josué 15:15-19].

 

            8. “Falamos teosofia (theou Sophia) em um mistério, até mesmo a sabedoria oculta (de Deus).

 

            9. “Sabedoria dentre aqueles que são perfeitos (literalmente, maduros, implicando iniciados). (...), aos outros falamos como crianças pequenas” [1 Coríntios 2:6 e 1 Coríntios 3:1]

 

            10. “Tais coisas (no livro de Moisés) são uma alegoria; pois há duas alianças: uma é a do Monte Sinai, que gerou enquanto cativa, que é Agar” (a estrangeira que deve ser descartada como alheia à alma e ao verdadeiro sentido) [Gálatas 4:24].

 

            11. “Mas Jerusalém, que pertence ao alto (a doutrina perfeita, contida nos sentidos internos) é livre, a qual é a mãe de nós todos.

 

            “Mas o que diz a Escritura? Expulse a mulher cativa (o sentido literal) e seu filho” (a falsidade gerada a partir desse sentido) [Gálatas 4:24-30].

 

            12. “Não percebeis ainda, tampouco compreendeis? Tendes vossos corações endurecidos?

 

            13. “Tendo olhos, não vedes? Tendo ouvidos, não escutais, e não vos lembrais?

 

            14. “Como é que não compreendeis?”

 

            15. “Prestem atenção; acautelem-se do fermento dos fariseus” (literalismo e formalismo), “e do fermento de Herodes” [Mateus 16:6] (o Sacerdotalismo, que é sempre o assassino da intuição pura, e, por conseguinte, o assassino da inocência no homem. Tanto a palavra quanto o fato indicam Herodes como idêntico à Serpente do Éden).

 

            16. “Ó tolos e lerdos de coração para crerem em tudo o que os profetas falaram. (...) E começando por Moisés e todos os demais profetas, ele interpretou para eles em todas as Escrituras as coisas que diziam respeito a ele próprio” [Lucas 24:27]. (Pouco ou nada disso aparece numa leitura superficial dos livros mencionados.)

 

            17. “Ai de vocês advogados (Sacerdotes)”! “Pois vocês jogaram fora a chave do conhecimento (Gnosis); vós mesmos não adentraram, e aqueles que teriam adentrado vocês os tem impedido” [Lucas 11:52]. (Dirigido ao Sacerdotalismo de todos os tempos.)

 

            18. “Mas isso eu (Paulo) confesso a vós, que segundo a maneira com que eles” – os sacerdotes, meus acusadores – “chamam de heresia, assim louvo eu o Deus de meus pais, acreditando em coisas que estão escritas na lei e nos profetas” [Atos, 24:14].

 

            19. Pois, como Jonas foi um sinal para o povo de Nínive, assim também será o Filho do homem para esta geração” [Lucas 11:30] (Pois o engolir Jonas pela baleia representou a supressão da verdadeira doutrina pelo Sacerdotalismo de seu tempo, e sua expulsão [de dentro dela], representou a restauração dessa doutrina, por meio da qual a Igreja foi liberta para cumprir sua missão, e assim seria Cristo uma demonstração individual dessa doutrina para o mundo, a despeito de sua supressão pelo Sacerdotalismo de Seu tempo.)

 

            20. “Se viverdes segundo a carne, morrereis.” [Romanos 8:13]

 

            21. “Daqui em diante, não conhecemos nenhum homem segundo a carne; sim, ainda que tenhamos conhecido a Cristo segundo a carne, no entanto, agora e daqui em diante já não O conhecemos mais.” [2 Coríntios 5:14]. (A carne denota aqui o sentido literal e pessoal, em distinção à verdade espiritual representada por Cristo, a saber, a doutrina da salvação pela regeneração como o caminho único para todos.)

 

            22. “Se Davi então o chamou de Senhor, como é ele seu Filho?” [Mateus 22:45]. (Um exemplo da confusão causada por se entender como sendo pessoas onde princípios era o significado pretendido).

 

            23. “Dê a César as coisas que são de César, e a Deus as coisas que são de Deus” [Mateus 22:21]. (Essa é uma injunção que se dá em razão de se atribuir o devido valor relativo aos dois sentidos das Escrituras, em distinção à preferência exclusiva pelo sentido superficial.)

 

            24. “Compreendeis o que ledes?” “Como poderia eu compreender a menos que alguém me orientasse?” [Atos 8:30-31].

 

            25. “Sois um Mestre de Israel e não conheceis essas coisas?” [João 3:10]. (Essa é uma reprimenda dirigida ao Sacerdotalismo de todas as épocas devido a sua cegueira quanto à doutrina espiritual da regeneração, e sua preferência pela doutrina sacerdotal do sacrifício vicário, enquanto que o próprio Jesus foi o categórico e típico exemplo da doutrina espiritual da regeneração.)

 

            26. “Abre meus olhos de modo que eu possa perceber as coisas maravilhosas contidas na tua lei!” [Salmos 119:19]

 

            27. “Mistério; Babilônia a grande; a mãe das prostitutas e das abominações da terra.” [Apocalipse 17:5]. (Essa é uma denúncia feita por Jesus, falando por seu “Anjo” através de “João o Divino”, contra o Sacerdotalismo como sendo a “Mulher Escarlate”, por negar ao homem a faculdade do entendimento, ao insistir na autoridade como o critério de verdade, e fazendo com que o Mistério consista em algo que transcende e contradiz a razão, ao invés de simplesmente requerer que a razão seja aplicada a um plano mais elevado, uma vez que é espiritual; falsificando, portanto, a doutrina totalmente razoável, representada por Jesus.)

 

 

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