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XIV.

 

Sacerdotalismo Negou a Dualidade Divina e,

Suprimiu o Entendimento

 

 

            A mesma negação constitui uma blasfêmia também contra o Logos. Pois, como a expressão ou “Palavra” de Deus como Pai-Mãe, o Logos necessariamente representa ambos os progenitores e, como eles, e o Espírito Santo que procede desses progenitores através dele, o Logos é dual.

 

            Daí a dualidade implícita nos nomes Jeová, Shaddai, Adonai, e outros dados Hebreus e outros povos para o “Filho” como “terceira pessoa” na Trindade celestial – em distinção à Trindade eclesiástica. Na experiência beatífica conhecida dos videntes como a visão de Adonai, quer sejam aqueles videntes da Bíblia ou outros, ambas as formas [da dualidade] estão sempre presentes, sendo manifestadas alternadamente de acordo com a função exercida, segundo ela denote Vontade ou Amor, Projeção ou Recolhimento. Que esse fato esteja implícito mais do que expresso nos relatos da Bíblia acerca dessa experiência, deve-se às mesmas causas que têm dominado o Sacerdotalismo em sua supressão da própria doutrina.

 

            No “Mistério” agora recuperado, do qual os versos iniciais do Evangelho de São João são derivados, essa suprema doutrina do Logos está assim expressa: –

 

            “Então, do seio da Dualidade Divina, o Filho Unigênito de Deus surge do recôndito:

            Adonai, a Palavra, a Voz invisível.

            Ele estava no princípio, e por meio Dele todas as coisas foram manifestadas.

            Sem Ele, nada do que é visível foi feito. Pois Ele é o Manifestador, e Nele estava a vida do mundo. (...)

            Ele é de Seu Pai o Espírito, e a Sua Mãe a Grande Profundeza.

            Possuindo a potência de ambos em Si Mesmo, bem como o poder sobre as coisas materiais.

            Sendo, no entanto, Ele Mesmo invisível, pois Ele é a causa e não o efeito.

            Ele é o Manifestador, e não aquilo que é manifestado.

            Aquilo que é manifestado é a Divina Substância”. (1)

 

            O termo “manifestado”, contudo, não é absoluto mas relativo. Embora não manifestado para a parte fenomênica do homem, a Terceira Pessoa na Trindade celestial –. O “Filho”, “Logus”, ou Adonai – é manifestado para sua parte substancial. Desse modo, temos que a contradição entre as afirmações da Bíblia acerca dessa visão de Deus pelo homem, e as negações de sua possibilidade, trata-se apenas de uma aparente contradição. A parte “homem” do homem – os sentidos externos e o intelecto – não pode “ver Deus”: mas, há aquilo no homem que pode ver Deus, a saber, a “mulher”, sua alma. E é para ela que a visão é concedida, e é dela que o Cristo no homem tem nascimento.

 

            Constituindo-se numa mutilação do Logus, ou Razão de Deus, a negação, quer explicita ou implícita, da divindade da substância, constitui uma mutilação da própria Razão, desde a própria fonte do Ser até as mais longínquas manifestações do Ser. Na medida em que é aplicado ao homem, esse pecado envolve a negação da alma, a intuição, a consciência moral e o entendimento; bem como da percepção do verdadeiro e do falso, certo e errado, bem e mal e, portanto, de Deus e do diabo, e a distinção entre eles. Pois, como aquilo no homem que sofre e dá à luz, relembra, reflete e apreende – enquanto o Espírito, como força e vontade, anima, impele e impõe – ela, a Alma, é aquilo em virtude do que ele conhece e alcança o entendimento. E se não for pelo dualismo constituído pela Alma em conjunção com o Espírito, ele não possui qualquer órgão de conhecimento, nenhuma faculdade de compreensão, mas fica sendo capaz, como o Sacerdotalismo tem insistido em torná-lo, de ser apenas um instrumento incapaz de razão a serviço do próprio Sacerdotalismo e de seus mestres.

 

            Tendo, por meio de tal mutilação da razão, abolido a Razão como um fator do Ser, seja divino ou humano, e tendo estabelecido sua independência de qualquer obrigação para com a razão, o Sacerdotalismo tem sistematicamente convertido toda a doutrina da Igreja de perfeita razão, que ela realmente é, em algo destituído da razão, até a completa deterioração de seu caráter divino, e até uma desesperante confusão do homem. Daí sua substituição do que possui sentido pelo sem sentido, chamando-o de mistério; da justiça pelos caprichos, chamando-os de graça; do amor pela vontade, chamando-a de Deus; da verdade pela falsidade, chamando-a de ortodoxia, e ao mesmo tempo anatemisando a verdade como heresia, perseguindo seus porta-vozes até a morte; substituindo a inteligência pela aceitação mecânica, chamando-a de fé; o serviço razoável pela subserviência ignorante, chamando-a de devoção; a redenção da inclinação ao pecado pela imunidade das consequências do pecado, chamando-a de salvação; a purificação do coração pelo derramamento de sangue, e esse dos inocentes, chamando-o de expiação e uma satisfação da justiça divina, um atributo de outro modo dispensado em favor da graça; e o espírito puro simbolizado pelo “sangue de Deus” pelo sangue físico de um deus, e o Cristo interior e Suas obras internas, assim como a verdade que Jesus veio para ilustrar e comunicar, pelo homem Jesus e seus sofrimentos corporais. Enquanto que, exaltando a virgindade como sendo aquela do corpo em lugar daquela que é da alma, e saturando-a com a própria materialidade cuja liberdade dessa mesma materialidade é aquilo que tal virgindade consiste, o Sacerdotalismo tem ao mesmo tempo incapacitado almas para a percepção do espírito e atribuído um estigma à divina, uma vez que natural, relação dos sexos, desse modo tachando-a de impura. E ao invés de tornar-se o lider de ações tendo como finalidade a regeneração do mundo por meio de puros e elevados ideais de vida, envolvendo a abolição de práticas grosseiras e cruéis, o Sacerdolismo tem persistentemente apoiado os poderes constituídos, tendo como objetivo os interesses materiais de sua própria ordem.

 

            Dessa maneira, sistematicamente afastando o homem da condição de perfeição de coração e mente que o aproxima de Deus, o Sacerdotalismo tem se interposto entre o homem e Deus, não como um mediador para uní-los, mas como alguém que os divide, os coloca em direções opostas e os mantém afastados. Fazendo o que, além de separar o homem de Deus, ele tem dividido o homem em si mesmo. Pois ele tem divorciado entre si, em todos os planos de seu sistema, aqueles que Deus uniu: Razão e Verdade, Conhecimento e Religião, Convicção e Ensinamento. E, assim dividindo para que possa imperar, ele tornou a si mesmo o separador e desintegrador do homem, até o completo desfazer da obra de Cristo, o qual, como o reconciliador e unificador, disse, “Aquele que não se une a mim, se dissipa”. E, desse modo, vendo toda a Razão de Deus apenas para exclamar: “Esse é o Herdeiro, vamos matá-lo, a fim de que a herança seja nossa”, o Sacedotalismo tornou-se ao mesmo tempo Anti-Cristo e blasfemador contra o Espírito Santo.

 

NOTA

 

(56:1) Vestida com o Sol, II, viii.

 

 

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